O milagre da multiplicação dos pescadores

A determinação do governo federal em tornar mais rígida a concessão do seguro-defeso para pescadores artesanais – a bolsa-pesca – já vem tarde.

Segundo o site Contas Abertas, gastamos em 2014 nada menos que R$2,4 bilhões com o programa, beneficiando 885 mil pessoas. Até ai tudo bem, não fosse o fato do Censo do IBGE de 2010 ter apontado a existência de 275 mil pescadores artesanais no país, o que faz supor algo como 610 mil bolsas ou R$1,65 bilhão concedidos irregularmente! Um verdadeiro milagre da multiplicação dos pescadores. Defeso, para quem não está habituado ao termo, é o período em que fica proibida a captura de uma determinada espécie para permitir sua reprodução e é um dos principais instrumentos de manejo e sustentabilidade dos estoques pesqueiros. Ele ocorre em diferentes épocas e regiões, em função do ciclo de cada espécie.

Normalmente, os defesos se estendem por três ou quatro meses, período em que os pescadores artesanais, impossibilitados de trabalhar, ficam sem renda. Por isso, desde 1992 – e com maior ênfase a partir da década passada – é pago um salário mínimo mensal a cada pescador durante os meses do defeso.

Este seguro faz parte do programa de seguro-desemprego, com verbas do FAT. Para ser beneficiado, o Ministério da Pesca concede uma licença de pescador artesanal e, com base nela, o Ministério do Trabalho concede o benefício.

Relatório da CGU – Controladoria Geral da União, que cruzou dados de janeiro de 2012 a junho de 2014 apontou a concessão generalizada do benefício a CPFs inexistentes, menores de idade, pescadores industriais, sócios de empresas privadas e servidores públicos, dentre tantos outros que sequer são pescadores ou mesmo moram em regiões pesqueiras

Um estudo do IPEA, realizado pelos pesquisadores André Gambier Campos e José Valente Chaves e publicado abril de 2014, faz uma análise detalhada das discrepâncias e desvirtuamento do programa.

Curiosamente, o estado campeão em concessões irregulares é de longe e precisamente o Pará, do nosso novo ministro Helder Barbalho.

Apesar de existirem no estado 67.859 pescadores artesanais, foram distribuídas no Pará nada menos que 166.106 bolsas (dados de 2010), beneficiando irregularmente 98.247 pescadores de pé-seco, como são chamados os espertalhões, o que representa um sobrecusto de R$237 milhões apenas neste estado!

Depois do Pará, aparecem em destaque os estados do Maranhão, Bahia e Amazonas. No gráfico abaixo dá para se ter uma idéia visual da concentração das distorções nesses estados.

Resta saber se o novo ministro terá firmeza suficiente para cancelar os registros irregulares, descontentando sua própria base eleitoral ou se será apenas mais um gato tomando conta do peixe.

Para saber mais visite:

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