Sufocada a pirataria, a pesca ilegal e a miséria aumentam na Somália

Cena do filme Captain Phillips, com Tom Hanks e Barkahd Abdi (segundo à esquerda), este no magistral papel do pirata Abduwali Muse, que sequestrou o navio Maersk Alabama. 
A incrível história da pesca clandestina e da pirataria nas costas da Somália acaba de dar mais uma volta em seu parafuso.

Surgida há cerca de dez anos, a pirataria foi a alternativa de sobrevivência encontrada pelos pescadores somalis diante do esgotamento dos cardumes provocado pelos navios de pesca estrangeiros que atuavam clandestinamente em águas territoriais do país. 
  
Um dos países mais pobres do planeta, a Somália tem uma larga e estratégica extensão litorânea e um mar territorial rico em cardumes de atum. Sem capacidade de patrulhar suas águas territoriais, o país assistiu impotente por décadas o esgotamento dos seus recursos pesqueiros e o empobrecimento dos pescadores da região. Dai para a pirataria, foi um passo.

Rota para os navios que demandam o Canal de Suez e boa parte do mundo árabe, os cargueiros próximos à costa eram alvo fácil e fonte de renda certa. A pirataria tomou conta da região e criou uma indústria milionária que empregou pescadores miseráveis e sem opção de vida, como retrata o celebre filme Captain Phillips, estrelado por Tom Hanks e Barkhad Abdi.

Essa mesma pirataria, contudo, afugentou os navios de pesca clandestinos que atuavam na região. E o que se viu foi a recuperação dos cardumes, em meio a uma espécie de moratória acidental. Os pescadores somalis estavam mais ocupados saqueando navios e os barcos chineses, iranianos, sul-coreanos, taiwaneses, franceses e espanhóis não ousavam se aproximar da costa da Somália.

Há cerca cinco anos, no seu ápice, os ataques eram quase diários e os prejuízos para a marinha mercante incalculáveis. A partir de então, a OTAN investiu US$75 milhões  em uma força tarefa que sufocou a pirataria na região.

Hoje, as águas ao largo do Chifre da Africa voltaram a ser seguras… inclusive para os navios de pesca clandestinos, que retornaram com toda força para a região, em busca dos cardumes renovados.  E os pescadores somalis voltaram a assistir impotentes a dilapidação dos seus recursos pesqueiros.

O governo somali e as associações de pesca afirmam ter solicitado repetidamente o apoio da OTAN no combate à pesca ilegal, sem sucesso. O comando da Força-Tarefa alega ter mandato apenas para combater a pirataria e não a pesca clandestina. Por isso, não repassa à guarda-costeira somali as informações que dispõem sobre a presença de navios que entram clandestinamente nos 400 mil km2 de mar territorial somali, com bandeiras e nomes trocados e transponders desligados.  

Para os somalis, a OTAN (leia-se o Ocidente) se preocupa apenas com seus próprios interesses, enquanto a população local vai se empobrecendo ainda mais.

E hoje não há mais a possibilidade da pirataria. As opções que restam, e que estão em franco crescimento, é o tráfico humano e a imigração ilegal para o Yemen ou para Arábia Saudita, uma travessia arriscada de cerca de 300km pelo Golfo de Aden, para um futuro incerto.  Ou ainda juntar-se ao al-Shabaab, o grupo militar islâmico ligado a Al-qaeda que atua no sul da Somália. 

Para saber mais, a revista Newsweek publicou recentemente excelente matéria a respeito, no link http://bit.ly/17jgFGy