Senado debate nova lei para o patrimônio cultural subaquático

Depois de amargar uma espera de mais de cinco anos, começou no Senado o debate sobre o projeto de lei 45/2008 que estabelece novas normas para o patrimônio cultural subaquático – naufrágios, aeronaves, vestígios arqueológicos e demais bens submersos de valor cultural.

© UNESCO/E. Trainito, Nuafrágio de Pollockshields, Bermudas

A nova lei, já aprovada na Câmara:
• Transfere da Marinha para o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) a guarda e a preservação destes bens;
• Proíbe qualquer tipo de exploração comercial; prioriza sua preservação in situ, isto é, autoriza seu resgate e remoção apenas quando o bem estiver comprovadamente em risco
 • Obriga a comunicação imediata de descoberta ocasional e – atenção mergulhadores! – criminaliza a retirada de objetos do fundo do mar
• Autoriza a exploração e pesquisa científica desde que seja apresentado um projeto assinado por um arqueólogo submarino responsável.

Apresentado em 2006 pela Deputada Nice Lobão, este projeto é uma iniciativa e traduz um consenso da Marinha, do IPHAN e da Sociedade Arqueológica Brasileira, preocupados com dilapidação e destruição de sítios arqueológicos submersos e pretende alinhar a legislação brasileira com a Convenção sobre a Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático da Unesco, de 2001, da qual o Brasil não é signatário exatamente por ter uma legislação divergente.

Pela lei atual a União, que detém a propriedade dos bens submersos, pode autorizar a exploração comercial de naufrágios, ficando no mínimo com 60% do valor dos bens resgatados. Tem ainda garantido o direito de escolha ou pagamento em dinheiro dos 40% de remuneração do particular. Quem representa a União para a concessão de autorizações é a Marinha e não o IPHAN.

Se aprovada, a nova lei põe fim à “caça ao tesouro” em águas territoriais brasileiras.

Como sempre a intenção – no caso, evitar a dilapidação do patrimônio submerso brasileiro – é louvável. Resta saber se a nova lei, ao proibir a participação da iniciativa privada na prospecção de naufrágios (e sua conseqüente remuneração em bens resgatados ou dinheiro) irá efetivamente contribuir para que isso aconteça.

Para que a lei funcione serão necessárias duas coisas.

Primeiro, como o próprio texto da nova lei obriga, a União deverá promover o inventário sistemático dos sítios arqueológicos, a exemplo do que o IPHAN vem fazendo com o patrimônio em terra desde sua fundação, lá pelos idos de 1937.

Isto significa ter estrutura (embarcações, equipamentos, pessoal especializado, arqueólogos submarinos, etc.etc,) e recursos (custeio de toda essa estrutura) para localizar, identificar, relacionar e avaliar como preservar os bens culturais submersos em águas territoriais brasileiras.

Em segundo lugar, ter capacidade de fiscalização e repressão de atividades ilegais de resgate em toda a Amazônia Azul, uma área de cerca de 4,5 milhões de km2 quadrados, que continuará sendo de responsabilidade da Marinha.

Ou seja, se não tivermos estas duas capacidades, estaremos simplesmente entregando este patrimônio à pirataria e à exploração clandestina – ou condenando-o ao desaparecimento.

Assim, mais do que simplesmente discutir e aprovar uma bela lei, temos a obrigação de garantir os meios para que ela seja efetivamente implementada. Caso contrário, será mais uma lei que “não pegou”.

E, neste caso, fica a pergunta: não será melhor então deixar como está e admitir a participação controlada da iniciativa privada, passando para o IPHAN a gestão deste patrimônio?

O assunto é bastante complexo e o debate no senado está apenas começando. Para quem quiser mais informações sugiro assistir o belo vídeo da UNESCO sobre a Convenção, disponível no Youtube no link

(Está em inglês, mas dá para colocar legendas horrorosas em português)

Os debates da Comissão de Educação do Senado podem ser vistos em uma série de 3 reportagens da TV Senado, no link que nem o Bitly conseguiu encurtar

http://www.senado.gov.br/noticias/tv/programaListaPadrao.asp?ind_click=0&txt_titulo_menu=Resultado%20da%20pesquisa&IND_ACESSO=S&IND_PROGRAMA=&COD_PROGRAMA=&COD_VIDEO=215327&ORDEM=0&QUERY=patrim%F4nio+cultural+subaqu%E1tico&pagina=1 

Depois de passar pela comissão de Educação o projeto será também debatido na comissão de Meio-ambiente.